Em tempos como nosso, em que a ansiedade tornou-se uma pandemia, em que as pessoas vivem mais do que nunca preocupadas com o amanhã, muito mais do que em viver seu presente… são tempos em que é importante aprender uma lição bastante interessante, uma que o montanhismo me ensinou e quero compartilhar.
O montanhista quase sempre têm como objetivo a conquista de um cume ou um ponto específico da montanha que simboliza sua vitória sobre ela, sobre a dificuldade que é alcançar aquela vitória, aquela grande realização pessoal. O prazer de alcançar o cume de uma montanha é indescritível e maravilhoso, como o prazer de qualquer conquista alcançada com esforço e sacrifício. Aquele momento é quase mágico e mostra que você conseguiu! É um sentimento sensacional! Algo que só conhece quem se desafia e consegue superar seus limites. Gostaria que todas as pessoas experimentassem isso em todas as áreas da vida.
Porém, a trilha até o cume da montanha é sempre longa e difícil, cheia de obstáculos. Não é qualquer pessoa que consegue chegar, principalmente sem preparação. A insistência em fazê-lo sem o devido preparo é extremamente penosa e quem tenta geralmente acaba desistindo de vez do esporte. A chegada ao cume, por sua vez, é bastante prazeirosa, mas breve. Após a conquista é preciso retornar e esse retorno também não é nada fácil, às vezes é até pior que a subida. Por isso, não é possível ficar no cume por muito tempo.
De forma semelhante atletas em geral, tanto profissionais como amadores, dedicam-se meses, anos e até uma vida inteira para realizar determinadas conquistas. Desde campeonatos locais, estaduais e nacionais até uma medalha de ouro olímpica. Sempre há algo em comum em todas essas realizações, que é a enorme dedicação do atleta para alcançar a vitória almejada. Nada que consideramos relevante vem fácil. O que vem fácil, geralmente desvalorizamos.
A realização, a conquista, a vitória final, porém, possui uma característica que pode ser muito frustrante para muitos de nós: toda vitória é breve. O prazer do momento em que se alcança o objetivo é intenso e indescritível! Mas é breve, passageiro, efêmero. Qual o problema disso? A vida de qualquer um de nós é muito mais extensa que o momento de qualquer vitória. Além disso, as batalhas que se trava por elas são, em geral, muito longas e ocupam a maior parte das nossas vidas. Isso significa que fatalmente vamos passar muito mais tempo buscando que alcançando as coisas que almejamos. Aquele que vive sempre com foco total no objetivo – sem encontrar prazer e alegria no processo, na busca – corre o risco de viver ansioso e até frustrado.
Já assisti muitas vezes esse filme: pessoas que passam grandes apertos e travam enormes batalhas para alcançar certas coisas, condições ou situações – contudo, quando alcançam, começam a reclamar e já querem alguma outra coisa. Elas não encontram satisfação no que alcançaram, suas vidas são um constante vazio.
Raul Seixas, em sua música “Ouro de tolo”, chega a cantar, após diversos lamentos ao longo da música, que “…foi tão fácil conseguir, e daí? Eu tenho uma porção de coisas grandes para conquistar e eu não posso ficar aqui parado…”. A música nos leva a uma reflexão muito interessante, recomendo ouvir a letra com atenção.
O cume, o alvo, o objetivo é realmente importante e trás grande alegria, mas ele pode nos viciar se não entendermos que ele é apenas mais uma meta em nossas vidas e não a nossa própria vida, em si. Condicionar nossa felicidade ou satisfação a esses “cumes” pode ser algo torturante para nossas almas. Tornam-se uma cobrança exagerada, uma viagem ao sol – infinita e frustrante, por definição.
Quem sempre olha para aquilo que não têm ou não é, está sempre infeliz e frustrado. É preciso encontrar prazer na caminhada, esse é o melhor jeito de caminhar, não importa qual seja a direção.
Satisfação na caminhada significa alegria no processo, na busca, no treino, na subida, nos estudos, no dia a dia do trabalho, no cuidado com aqueles que amamos. Encontrar prazer na preparação é viver de fato a sua vida, sem passar todo tempo almejando uma felicidade que se concretizará apenas no cume. É muito triste ser feliz apenas no cume e lamentar por todo caminho até ele.
Gozar no caminho é ser grato, é entender o quão valiosos são todos os momentos da sua vida e não só o momento em que você alcança o que deseja. Quando aprendemos isso a vida se torna mais fácil de ser vivida e bem mais alegre.
Devemos lembrar sempre que as lutas e as batalhas são longas, mas as vitórias são sempre breves. Elas têm o papel de nos dar motivação para continuar treinando, lutando e crescendo. Porém, é a disciplina que nos segura pela mão quando a motivação, algo meramente emocional, nos abandona.
Lute pelo cume, mas aprenda a gozar no caminho! Teremos poucos comes na vida, porém inúmeras caminhadas – elas poderão nos dar muito mais prazer e tornar a vida mais fácil se aprendermos a trilhar bem.