Sinto o hálito quente da morte.
Quente como as fornalhas do inferno.
Ouço seu assovio quando passa por trás do meu ouvido,
Dá a volta em minha cabeça e alcança minhas narinas.
O cheiro forte de mil sepulcros é insuportável.
E ele enche minha alma de pavor e nojo.
Sua presença… a vejo mesmo de olhos fechados.
Apreciando a presa enquanto trama o fatídico golpe.
Sua foice em meu pescoço ela faz deslizar…
E admira a cada segundo… impar, especial.
Prolongam-se esses momentos até a eternidade.
O derradeiro suspiro esvazia o ar da terra.
Por minhas costas terríveis tramas.
E toda sutileza desse último e etério momento.
A beleza poética e mórbida do destino de todos nós.
Paira em trevas densas a alma despida.
Enquanto desliza a foice, a vítima divaga em retrospectivas.
O longo filme da vida deslumbra e entorpece a todos nós.
Prostrada, no chão, estagnada e indefesa.
Aguarda que sua cabeça role – inevitavelmente!
A morte, de pé, ostenta dominação e força.
A coisa, encolhida, há poucos segundos de perder a vida.
A cena, entenebriante, toma de assalto qualquer expectador.
O destino, insensível, conduz todos ao abismo.
O homem passa seus dias temendo esse último.
Nega-o, esconde-se… oprime a simples menção a ele.
Quem dera ao cordeiro defender-se de seu abatedor.
Quisera o filhote retaliar o predador. Não podem!
A morte geralmente cobre de suspense suas vítimas.
Antes do abate, a morte as leva a delirar.
Não é bastante morrer, é preciso que sofram.
É interessante que sintam escoar vagarosamente a vida.
Há, contudo, certa beleza nisso.
Nossa arrogância vê limite diante dela.
Nossa ambição encontra seu poder e cessa.
Nossas torres caem, nossos castelos ruem.
Diante dela todos somos sinceros, estamos nús.
Sua presença nos arrepia – fechamos os olhos bem apertados,
Mas podemos sentí-la tão tenebrosa quanto.
É impossível olhar a morte nos olhos e contemplar sua face.
Se o fizéssemos, contudo, encontraríamos nosso próprio semblante.
Como quem no espelho aplica à própria gargante afiada adaga.
Não veríamos um outros ser, mas nossa própria mão empunhando a foice.
Pois no fundo, o homem se mata a cada dia um pouco.
Ele é ao mesmo tempo o algóz e a vítima.
Empunha o próprio destino, trás pavor à própria alma,
Faz de sí um prisioneiro e desliza em seu próprio pescoço a foice.
Torturando a si mesmo enquanto trama seu final.